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Arquitetos: M2.senos arquitectos
- Área: 100 m²
- Ano: 2023
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Fotografias:Ivo Tavares Studio
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Fabricantes: Geberit, Mármores Central de Vagos, Primelux
Descrição enviada pela equipe de projeto. Gouveia, localizada no sopé da Serra da Estrela, tem presente na sua toponímia a Avenida General Humberto Delgado, rebatizada após o 25 de abril de 1974. Trata-se de uma icónica avenida, à cota alta da cidade, de carácter habitacional, confirmado pela presença das imponentes moradias, perfil viário generoso, pontuada pelo vasto arvoredo existente. É neste contexto, integrado entre o casario, que se localiza o edifício projetado em 1965, com 3 pisos e 6 frações. Sem pretensões, estas construções no seu estilo modernista, à semelhança de tantos outros exemplares seus contemporâneos, pontuavam as principias cidades do país. Se o uso de palas em betão, varandas corridas a acentuar alguma horizontalidade, janelas em madeira com 3 folhas, são elementos comuns, destaca-se fortemente o contexto local. Especificamente, a sua implantação nos socalcos suportados por muros em granito, ou os detalhes de cantarias em pedra local que lhe atribui alguma personalidade. Assim, o apartamento renovado, situa-se no primeiro andar, no entanto, atendendo à topografia própria do local permite acesso nivelado pelo tardoz.
A intervenção tinha como objectivo preservar ao máximo o existente, por uma questão económica, mas também para manter o seu carácter, respeitando os seus detalhes, os pavimentos, as caixilharias em madeira ou o mobiliário antigo. A organização espacial respondia bem: um núcleo íntimo com 3 quartos distinto das zonas sociais, duas salas, e a cozinha. Existia ainda um quarto de pequena dimensão com instalação sanitária, junto à cozinha e ligado à lavandaria. Aposentos destinados a uma empregada, memória de outros tempos, que não fazia sentido manter. Assim, as alterações foram simplesmente a desmontagem deste espaço, transformando-o na copa da cozinha e a autonomização da instalação sanitária, voltando-a para o corredor, acessível a todos. Também o conjunto de salas e cozinha foi intervencionado de forma a tornar os espaços mais comunicáveis, potenciando as vivências e a exposição solar. Assim, uma vez que estando a cozinha voltada a nascente e as salas a poente, é possível agora, ao logo de todo o dia, adivinhar o exterior.
O exercício passou pela criação destas relações directas, em especial entre as salas, entre as salas e as varanda, entre a sala de jantar e a cozinha e entre a cozinha e o logradouro, mantendo toda a estrutura, evitando uma leitura de “openspace”. O trabalho de carpintaria teve um papel fundamental, porque foi através do seu desenho, sempre a interpretar o contexto, que se silenciou a intervenção.
Foram necessários 3 intervenientes específicos. O marceneiro geral da obra que tratou os pavimentos e executou os móveis de bancada da cozinha e os lavatórios em madeira maciça de Sapel. O carpinteiro que restaurou o mobiliário, como a antiga cristaleira, os aparadores e as cadeiras. E o carpinteiro que se dedicou à iluminação, com a recuperação do candeeiro em cobre e latão, através da aplicação de novos abajures executados em maple, ou ainda os candeeiros de pé em madeira de sucupira que pontuam a separação das salas de estar e jantar. Em complemento, os têxteis assumem também protagonismo: as cortinas, os forros de cadeira ou o sofá cor terra. De referir ainda o banco com a almofada em burel verde musgo, trabalho de excelência da manufatura da região da Serra da Estrela, que transforma a lã de ovelha, em peças de uma nobreza impar. Preparado para o conforto em defesa do rigoroso inverno da Serra da Estrela. É preciso que tudo mude, para que tudo fique na mesma. Pronto para mais uma geração.